DALTON DI FRANCO

DALTON DI FRANCO
Jornalista, escritor, radialista, administrador de empresas, pós-graduado, professor universitário e Advogado. Ele já foi vereador, deputado estadual e vice-prefeito de Porto Velho (RO)

segunda-feira, 18 de maio de 2009

"O direito penal reprime, o processo penal liberta"

Por Alessandro Cristo
O Estado não pode abrir mão das interceptações telefônicas, mas elas só devem ser usadas em casos de crimes específicos e quando outras provas já foram colhidas. Suas transcrições devem ser feitas por técnicos treinados, e entregues na íntegra tanto à acusação quanto à defesa dos acusados, com antecedência que permita a ambas as partes escolherem trechos para suas alegações. Os limites que você acaba de ler não estão completamente previstos na legislação brasileira atual, mas deveriam estar, pelo menos na opinião de uma das mais respeitadas processualistas do Brasil dentro e fora do país, a professora Ada Pellegrini Grinover, titular da cadeira de Direito Processual da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Comprometida com estudos sobre o tema há quase 30 anos, quando começou a elaborar anteprojetos que deram origem à atual Lei de Interceptações — a Lei 9.296/96 —, a especialista vê no abuso do uso de escutas uma mediocridade da polícia e do Ministério Público.
Em entrevista à Consultor Jurídico, Ada destacou falhas crônicas do uso de grampos. Uma delas está na disparidade de acesso entre advogados e promotores às provas colhidas. "Após anos de gravações, os órgãos policiais fazem a transcrição e escolhem os textos que interessam. Eles recolhem esse material aos poucos, mas a defesa tem que examinar em 30 dias", aponta. Segundo ela, técnicas mais modernas de investigação — como a italiana — já permitem que as gravações sejam ouvidas pelos dois lados e pelos juízes, e que cada um pode escolher os trechos que mais interessam.
Parte do problema pode estar, na opinião da professora, na formação dos operadores do Direito. "Há cursos de Direito Penal, de Direito Processual Penal, que são municiosos de garantias, mas há outros em que o Processo Penal é o do inimigo", diz. Em relação aos juízes, isso pode resultar em uma mentalidade acusatória, principalmente por causa de pressão da sociedade. "Nenhum juiz é neutro, nem deve ser neutro. O juiz naturalmente traz consigo sua cultura, sua formação, seus elementos de convicção", explica. Por isso, a ponderação seria o remédio sem contra-indicações.
O excesso de litigância e a falta de juízes são os principais causadores da crise no Judiciário, na sua opinião. Ela defende que, para diminuir a demora na tramitação dos processos, os cartórios judiciais precisam ser coordenados por administradores, com formação estratégica voltada para a organização, e não pelos magistrados. "Na Alemanha e na Espanha, quem administra o cartório é um administrador judicial, não o juiz. O juiz não tem tempo nem aptidão para fazer funcionar o cartório", afirma.
Ada elogia a iniciativa do Supremo em ocupar os espaços deixados pelos Poderes Legislativo e Executivo, e afirma que a Justiça tem sim como obrigar o poder público a cumprir suas decisões. Ela também comenta sobre a criação da Lei de Ações Civis Públicas e os esforços para permitir um maior número de legitimados a ajuizar ações desse tipo.
O conhecimento da professora foi imprescindível na elaboração de diversos projetos de lei que fizeram mudanças importantes no Direito nacional e internacional. Além das discussões que culminaram com a Lei de Interceptações Telefônicas, Ada participou da elaboração do Código de Defesa do Consumidor, da Lei de Ações Civis Públicas, do Código de Modelo de Processos Coletivos do Instituto Ibero-Americano de Direito Processual e das leis que recentemente reformaram o Código de Processo Penal, entre tantos outros.
Nascida em 1933 em Nápoles, na Itália, a procuradora aposentada do Estado de São Paulo chegou ao Brasil em 1951. Ela é autora de mais de duas dezenas de livros jurídicos. É doutora honoris causa pela Universidade de Milão, na Itália e ocupa a 9º cadeira da Academia Paulista de Direito. É presidente do Instituto Brasileiro de Direito Processual e vice-presidente do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais.



Mas não é só pelas leis que ajudou a fazer que o nome de Ada é lembrado nos tribunais. Em uma ação de indenização por danos morais, ela protagoniza uma queda de braço com outro ilustre processualista brasileiro, Antonio Gidi, professor assistente da University of Houston Law Center, que já deu aulas em universidades da Itália e da França.
Ada entrou com a ação contra o professor porque Gidi escreveu, em livro lançado no ano passado, que seu nome foi excluído da autoria do Código de Modelo de Processos Coletivos do Instituto Ibero-Americano de Direito Processual, elaborado por ele, Ada e Kazuo Watanabe. No livro Rumo a um Código de Processo Civil Coletivo — a codificação das ações coletivas no Brasil, o professor fez críticas a um projeto elaborado por um grupo comandado por Ada. Ele disse que o texto é tímido perto do anteprojeto original, do qual participou da criação. Em janeiro, o juiz César Santos Peixoto rejeitou o pedido de indenização. A professora já recorreu ao Tribunal de Justiça de São Paulo.

Fonte: Consultor Jurídico

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